19 dezembro 2022

punish you for things you never did

é como funciono, te digo enquanto você está prestes a dormir. sinto teu suspiro em meu cabelo. você não aguenta mais minhas epifanias na madrugada. você só quer dormir. mas escuta: eu me sinto tão pequenininha aqui, tão prestes a ser derrubada, o que você pode fazer a respeito? você quer fazer alguma coisa a respeito? você quer alguma coisa? de mim? de nós? você se senta, o suspiro volta, esfrega os olhos e me pede para repetir com calma. você sabe que não pode me pedir calma às 03h, que é justamente quando tem sangue nos meus olhos e minhas mãos tremem. eu funciono assim, volto a falar, eu só consigo me entregar se entender que você também está se entregando. eu só consigo gostar de quem gosta de mim. eu só quero atenção. você franze as sobrancelhas e agora esfrega o rosto inteiro, me perguntando se não é claro o suficiente, afinal, está aqui comigo, bem aqui, não é atenção o suficiente? não. não é. eu quero tudo. eu preciso saber se vou ter tudo. você consegue entender? você consegue? não, você responde e nunca esteve tão acordado ou tão cansado. é difícil ler teus olhos no escuro. eu sei que logo soltará a frase que todos eles soltaram antes de você deitar na minha cama e desejar dormir tranquilamente. você vai perguntar “o que você quer de mim, porra?” e eu nunca vou saber responder, nunca soube, para nenhum deles. eu vou rebater com um “e você, o que você quer de mim?” para ver como uma pessoa normal responderia porque eu não sei ser normal, você não entende? não vê? olha tudo que está girando na minha cabeça, não faz nem sentido, eu quero gritar e te acusar por crimes cujas digitais não são nem tuas. eu quero que você me impeça de tomar desse veneno enquanto bebe dele também porque está por todo o lugar, escorrega pela minha pele como nosso suor. é tudo veneno, você não vê? é toxicidade deixando queimaduras que teus beijos não serão capazes de curar. por favor, vá embora, eu peço, mas vou te culpar para sempre se você for. “o que você quer de mim, porra?”. eu não sei. sou uma mulher que não sabe. eu te liberto para procurar alguém que queira alguma coisa, que saiba lutar por isso, que saiba nomear, que saiba falar antes das 03h da manhã, que não te acorde assim, que não te pegue pela mão e peça por favor, por favor, não vá, sabendo que é melhor ir antes que o crime seja realmente teu. e você só quer dormir.


é assim que funciono, digo para outra pessoa daqui um ano e ela se vai antes que eu termine de falar, pois, ao contrário de mim, é alguém que sabe exatamente o que não quer.